02/07/2025 – 16:13
Vinicius Loures / Câmara dos Deputados
Marina Silva foi ouvida na Comissão de Agricultura
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, atribuiu o aumento das queimadas no Brasil a incêndios criminosos e à seca extrema, em audiência pública na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (2). A audiência foi marcada por clima tenso, e a ministra considerou que foi alvo de várias grosserias e que foi “terrivelmente desrespeitada” por deputados.
“De fato, nós tivemos em 2024 um aumento dos incêndios no Brasil. Esse aumento de incêndio se deu em função de um extremo climático e não afetou apenas o Brasil, afetou o mundo inteiro”, afirmou a ministra. “Qualquer pessoa que não seja negacionista sabe que a seca com baixa precipitação, temperatura alta, perda de umidade potencializa os incêndios”, completou.
Ela observou que muitos incêndios foram provocados de forma criminosa, citando notícia segundo a qual os inquéritos da Polícia Federal sobre incêndios criminosos triplicaram em 2024. “Ou seja, nós tínhamos ali uma retroalimentação perversa: a seca extrema, incêndios criminosos, materiais a ponto de combustão”, salientou.
Conforme a ministra, as providências tomadas pelo ministério incluíram articulação com os governadores, aumento da quantidade 30% de brigadistas nas operações do Ibama e do ICMBio em relação ao governo anterior; e aumento de recursos para combater o problema. Ela estima em R$ 1,5 bilhão o valor destinado ao combate desses incêndios, frente a menos de R$ 400 milhões no governo Bolsonaro. “Fizemos uma verdadeira força-tarefa no País para evitar uma situação de completo descontrole”, garantiu.
Controvérsia sobre desmatamentoPresidente da comissão e autor do requerimento de audiência, o deputado Rodolfo Nogueira (PL-MS) afirmou que, sob a gestão de Marina Silva no Meio Ambiente, o desmatamento na Amazônia aumentou 482%. “As queimadas bateram recorde, e sua resposta tem sido o silêncio ou a burocracia”, disse.
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
Rodolfo Nogueira, presidente da comissão
“Aqui, a senhora trouxe uma explicação para as queimadas do Brasil jogando a culpa em São Pedro, e o Ministério do Meio Ambiente nada faz diante do crescimento das queimadas e do desmatamento, desmatamento este praticamente liberado pelo ‘seu’ Ibama para construir a estrada do COP30. Vergonhoso, ministra”, afirmou Nogueira.
“Que ironia cruel, um evento climático internacional sendo viabilizado à custa de desmatamento em plena floresta amazônica”, disse ainda o parlamentar, sobre a construção de uma rodovia na Amazônia para receber a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2025 (COP30).
Ações contra desmatamentoA ministra rebateu: “o Ibama aumentou sua capacidade de fiscalização em 96%, o ICMBio aumentou sua capacidade de fiscalização em mais de 200%, nós aumentamos os nossos orçamentos, fizemos concursos, temos inúmeras operações, milhares de operações quando envolve terra indígena, desmatamento, exploração de madeira”.
“Foi graças a esses esforços, sob orientação do presidente Lula, que tem compromisso de desmatamento zero até 2030, que nós tivemos o resultado de redução do desmatamento de 46% na Amazônia nos dois primeiros anos e de 32% no Brasil inteiro nos dois primeiros anos de governo do presidente Lula”, completou Marina Silva. Nesses dois anos, segundo ela, o agronegócio cresceu 15% e a renda capita cresceu cerca de 11%.
A ministra acrescentou que houve retomada do plano de combate ao desmatamento que o governo anterior tinha abandonado, e retomada do Fundo Amazônia, que ficou desativado durante quatro anos.
Ainda conforme ela, na Amazônia, a queda acumulada dos alertas de desmatamento em junho de 2025, comparada a junho de 2022, foi de 65% (menor índice para junho desde 2015). “Pela primeira vez, temos uma situação em que o desmatamento por incêndio [52%] tem sido maior do que o desmatamento por corte raso [48% das áreas desmatadas]”, informou ainda.
Sobre a estrada para a COP30, a ministra explicou que não é o Ibama quem licencia a estrada, e sim a Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará, e sugeriu aos deputados que recorram a essa secretaria para explicações, caso discordem da estrada. “São 13 km, um pequeno trecho, e pela lei ambiental consolidada, você até pode ter uma licença dentro de uma área protegida, desde que atendendo os regramentos estabelecidos”, informou.
Confisco de gadoRodolfo Nogueira criticou ainda o confisco de mais de 9 mil cabeças de gado pelo Ibama “de forma arbitrária, sem clareza dos critérios, sem respeito à propriedade privada, sem diálogo com os produtores”.
Ele sugeriu o investimento em programas de regularização, orientação e apoio técnico ao produtor. “Criminalizar quem produz não é política pública; é perseguição ideológica”, opinou. Para ele, o produtor rural tem sido tratado como inimigo pelo governo.
Além disso, o presidente da comissão criticou a falta de iniciativas do ministério para combater a invasão de javalis às lavouras.
Defesa do IbamaA ministra defendeu a atuação do Ibama e disse que apenas 2,6% dos imóveis rurais concentram 60% das irregularidades e que o confisco de gado só ocorre em propriedades com operações comprovadamente fora da lei, depois de alerta e aplicação de multas. Conforme a ministra, há decisão do Supremo Tribunal Federal respaldando as ações.
“Não há como você cumprir com a função, numa cultura de muitos crimes ambientais que vão sendo praticados em relação ao desmatamento, à exploração de madeira, a garimpo e a incêndios criminosos, se o agente público vai lá e não cumpre com sua função institucional”, avaliou. Ela observou ainda que quem se sente prejudicado tem a possibilidade de recorrer em relação à penalidade aplicada.
Sobre a invasão de javalis nas lavouras, a ministra respondeu: “o Ministério do Meio Ambiente está fazendo o plano nacional de prevenção, controle e monitoramento do javali, nós estamos fomentando a pesquisa, a avaliação de eficiência dos métodos para fazer esse manejo adequado e estamos fazendo estímulos a novos protocolos de manejo. Os animais não devem servir de alvo para aqueles que gostam de treinar tiros, tem um código de ética que precisa ser observado”, acrescentou.
AcusaçõesO deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES), que também pediu a audiência, acusou a ministra de ser “adestrada” e usar a mesma tática das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e dos grupos terroristas palestino Hamas e libanês Hezbollah. Além disso, acusou Marina Silva de ser incoerente, de ser mal-educada e deselegante ao responder o presidente da comissão.
O parlamentar disse ainda para Marina Silva pedir ajuda da assessoria do ministério para avaliar o Plano Safra. “Ministra, desculpa a senhora, eu não vou exigir da senhora o conhecimento profundo de economia”, disse. “Então, peça a assessoria, não sei se ela tem assessoria de economia no ministério, para ajudar a senhora a interpretar, você vai ver que é uma grande armadilha. É o maior anúncio, anote aí, e vai ser a menor entrega”, afirmou.
Segundo Evair Vieira de Melo, na gestão de Marina Silva houve o maior recorde de queimadas da última década. Ele acusou a ministra de falar inverdades, de adotar um discurso que “vale para um lado e não vale para outro”, e de ir muito ao exterior e “andar pouco pelo Brasil”.
RespostaA ministra, por sua vez, disse que se sentiu “terrivelmente agredida” e que nas falas dos deputados na comissão houve muito machismo e racismo. “Eu fiz uma longa oração. E eu pedi a Deus que me dessa muita calma, muita tranquilidade, porque eu sabia que depois do que aconteceu na Câmara Alta deste País, aqueles que gostam de abrir a porteira para o negacionismo, para a destruição do meio ambiente, para o machismo, para o racismo, depois do que aconteceu ali, as pessoas iam achar muito normal fazer o que está acontecendo aqui no nível piorado, mas acho que Deus me ouviu e eu estou em paz”, destacou.
“Eu estou em paz, porque tem uma palavra que eu repito sempre que eu aprendi com o apóstolo Paulo, que diz o seguinte: ‘É preferível sofrer injustiça do que praticar uma injustiça’. E eu prefiro sofrer injustiças do que praticá-las, porque, quando você pratica uma injustiça, pode ter certeza de que um dia a reparação virá. Quando você é injustiçado, a justiça virá”, completou.
Os deputados Túlio Gadêlha (Rede-PE), Talíria Petrone (Psol-RJ), João Daniel (PT-SE) e Juliana Cardoso (PT-SP), entre outros, defenderam a ministra e prestaram solidariedade a ela.
Reportagem – Lara HajeEdição – Wilson Silveira